domingo, 26 de janeiro de 2014

Setor energético polui 30% mais e gera 'meia Itaipu' de desperdício por ano

Em 2012 (último dado disponível), o segmento aumentou em 30% as emissões de CO2 em relação a 2006

O Brasil, que sempre se orgulhou de ter uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, com 46% de fontes renováveis, tem agora pelo menos dois motivos para se envergonhar.

O primeiro é que o setor de energia está mais “sujo”, com toneladas de gás carbônico (CO2) e outros gases de efeito estufa, que vêm sendo despejados no meio ambiente. Em 2012 (último dado disponível), o segmento aumentou em 30% as emissões de CO2 em relação a 2006 — principalmente na geração térmica.

O segundo motivo desabonador é o desperdício. Só no ano passado, o país desperdiçou 46,4 mil Gigawatts/hora (GWh), o equivalente à quase metade da energia gerada na usina de Itaipu (98,6 mil GWh). A energia não aproveitada é superior ao consumo de todo o Estado do Rio (38,9 mil GWh).

Os dados foram apurados pela Associação Brasileira das Empresas de Serviços de Conservação de Energia (Abesco) com exclusividade para O GLOBO. O presidente da Abesco, Rodrigo Aguiar, diz que a energia desperdiçada aumentou nos últimos anos, já que os programas de eficiência energética em execução pelo governo são insuficientes. A adoção de medidas de eficiência por todos os consumidores poderia resultar em redução de 10% no consumo, uma economia de R$ 11,5 bilhões.

— Muitos projetos de eficiência energética são feitos, mas pela dimensão do Brasil ainda é muito pouco frente ao potencial e à necessidade. O país precisa tirar os planos das gavetas e ser mais arrojado em políticas de curto prazo — alerta Aguiar. — A economia pode ser obtida com medidas como não deixar aberta a porta da geladeira até trocar uma caldeira. Seria uma espécie de geração virtual: o que deixo de consumir, disponibilizo no sistema.

Em 2012, o setor de energia foi responsável pela emissão de 436,7 milhões de toneladas de CO2, alta de 30% em relação às 335,7 milhões de toneladas em 2006, segundo o Observatório do Clima. Com isso, a participação da energia nas emissões foi de quase um terço (29,4%), contra 16,2% em 2006. O segmento de Energia ficou atrás só das atividades agrupadas como Mudança de Uso da Terra (queimadas), que representaram 32,1% das emissões, e da Agropecuária, com 29,7% do total de 2,07 bilhões de toneladas de CO2 emitidas.

Energias renováveis são fundamentais

Rodrigo Aguiar, da Abesco, lembra que, como o Brasil não tem mais construído hidrelétricas com reservatórios (hoje são a fio d’água), cresceu a geração de energia com térmicas a gás natural, carvão, óleo diesel e óleo combustível. Mas, acrescenta, a alta do consumo não deve ser atendida apenas com mais oferta de energia via térmicas. Para ele, “é fundamental" que o país invista em energias renováveis, como a eólica e a solar, e busque com urgência projetos de aumento da eficiência energética.

Na época do racionamento, em 2001, os brasileiros reduziram o consumo, adotando uma série de medidas, como o uso de lâmpadas LED. Mas, 13 anos depois, essa preocupação caiu no esquecimento de muitos.

Para o especialista Raimundo Batista, diretor da Enecel Energia (comercializadora de energia), o governo é culpado porque, em vez de lançar campanhas de incentivo à economia de energia, estimula o consumo com medidas como a redução de tarifas da conta de luz no ano passado:

— Esses programas de eficiência energética deveriam ter mais campanhas. É fácil cortar em 20% o consumo em qualquer residência ou comércio.

Para mostrar a importância de medidas de eficiência, Abesco calcula que uma lâmpada incandescente de 60 watts consome 600 watts em dez horas de funcionamento. Já uma LED de 8 watts, que gera igual luminosidade, gasta 80 watts.
— O governo conseguiu reduzir bastante as queimadas, mas coloca térmicas a carvão e a óleo que poluem absurdamente. É preciso adotar programas efetivos de eficiência energética — afirma Aguiar.
Já o coordenador do Grupo de Estudos de Energia Elétrica (Gesel), do Instituto de Economia da UFRJ, Nivalde de Castro, diz que no Brasil ainda é menor o custo de aumentar a oferta de energia — com hidrelétricas ou usinas térmicas a gás ou de fontes renováveis como eólica e solar — do que o de investir em programas de eficiência energética.
— Isso talvez explique o pouco empenho do governo nesses programas que na Europa são essenciais pois não há como expandir a oferta de energia.
A China, apesar de ser o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, é o país que mais investe em sua redução, desenvolvendo fontes de geração renováveis e aumentando a eficiência energética. Enquanto os chineses já têm cerca de três mil Escos (Empresas de Serviços de Conservação de Energia), no Brasil são em torno de 150.
Semana passada, a ONU divulgou relatório sobre soluções climáticas no qual diz que, para limitar o aquecimento global, a emissão de gases de efeito estufa terá de cair entre 40% e 70% até 2050. A estimativa é que o mundo terá, então, que investir US$ 147 bilhões por ano em energia de baixo teor de carbono (eólica, solar ou nuclear) e centenas de bilhões de dólares em eficiência energética até 2029.
Por isso, para o presidente da Abesco, o Brasil precisa mudar a cultura e promover programas de eficiência mais arrojados para todos consumidores.

— Não é preciso racionar energia e se privar dos benefícios da eletricidade. Eficiência energética é mudar hábitos nas casas, adotar processos, sistemas ou equipamentos que consomem menos energia. A troca de um sistema de ar-refrigerado em um hotel pode reduzir em até 35% o consumo — exemplifica Aguiar. — Os gastos menores com energia no país também elevam a produtividade e a competitividade, que, por sua vez, aumentam a lucratividade ou reduzem os preços.

Governo: eficiência é ‘muito importante’

No Brasil, existem vários programas de eficiência energética. Um dos mais antigos é o Procel, coordenado pela Eletrobras, que desenvolveu o selo para equipamentos industriais e eletrodomésticos que consomem menos energia. Há ainda o Plano Nacional de Energia, o Plano Nacional de Eficiência Energética (PNEf) e o Decreto Nº 7.390, que regulamenta a Política Nacional de Mudança do Clima. Mas o PNEf tem resultados pequenos: em 2013, reduziu o consumo em 1,6%. Este ano, a meta é 2,1%. Pelas projeções, só em 2030 o país vai economizar 10,3% de energia com eficiência energética.

A Abesco também desenvolve ações com órgãos do governo, como os ministérios de Minas e Energia e Meio Ambiente. Um dos projetos (ainda piloto) busca a eficiência energética nos prédios dos ministérios em Brasília. A ideia é estender a outros prédios públicos no país. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que o governo tem consciência da importância de se buscar a eficiência energética.

— O importante não é ter metas elevadíssimas, mas realistas que sejam acompanhadas e atingidas. É claro que a eficiência energética é muito importante e deve ser a primeira opção. O megawatt poupado é o mais barato, sem impacto algum — disse, ressaltando que programas do governo aumentam a eficiência energética, como mudanças de padrões mínimos de eficiência de equipamentos.


Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/economia/setor-energetico-polui-30-mais-gera-meia-itaipu-de-desperdicio-por-ano-11407063#ixzz2rWEHbXN9

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