segunda-feira, 18 de março de 2013

Nova lei traz incentivos para quem quer aumentar produtividade com uso sustentável da irrigação


Água na dose certa
por Francine Lima

http://revistagloborural.globo.com/Revista/Common/0,,EMI332287-18283,00-AGUA+NA+DOSE+CERTA.html

Irrigação por pivôs na região dos cerrados

Há um motivo novo para comemorar o Dia Mundial da Água – 22 de março – este ano. Em janeiro, o governo federal deu fim a uma espera de 17 anos e sancionou a lei 12.787, que institui a Política Nacional de Irrigação. Com isso, pretende incentivar o aumento da área de agricultura irrigada, reduzir o risco climático e favorecer um incremento substancial de produtividade, com o cuidado de conter prejuízos aos recursos hídricos e à qualidade do solo. Os termos “eficiência” e “manejo sustentável” dão o tom do marco regulatório, satisfazendo agricultores, engenheiros agrônomos e ambientalistas.

A nova lei reforça as estratégias de incentivo anteriores com novidades atraentes. O barramento destinado à irrigação privada poderá ser considerado obra de utilidade pública, o que deve encurtar o processo burocrático no órgão ambiental. O crédito rural será facilitado para compra de equipamentos eficientes, modernização tecnológica e implementação de sistemas necessários ao manejo da irrigação. Haverá ainda incentivo à contratação de seguro rural, tarifas especiais de energia elétrica e incentivos fiscais para projetos em regiões de baixos índices de desenvolvimento social e econômico. Pequenos produtores familiares, em especial os do Semiárido nordestino, deverão receber apoio especial. Para acessar os incentivos, é preciso ter outorga de uso de recurso hídrico e licença ambiental (quando exigidos), a justificativa necessária para irrigar e um bom projeto de irrigação.

As áreas a ser priorizadas nos futuros Planos de Irrigação, com suas respectivas fontes de financiamento, serão definidas conforme as necessidades e os recursos de cada região e em consonância com os Planos de Recursos Hídricos.


Para cada tipo de cultura, um sistema: entre eles, a microaspersão localizada...
Segundo Guilherme Orair, secretário nacional da Irrigação no Ministério da Integração Nacional, o crescimento da técnica no Brasil está abaixo do possível. Hoje, apenas 5,5 milhões de hectares são irrigados e há potencial para se chegar a 30 milhões. Nas estimativas do governo, é possível ampliar a área irrigada em pelo menos 10 milhões de hectares até 2030, gerando uma produtividade várias vezes maior que a atual. “Um aumento de área irrigada de 8% geraria aumento de produção de 20% em média”, diz o secretário.

A Região Centro-Oeste concentra grande potencial hídrico não aproveitado. Só o Tocantins tem mais de 4 milhões de hectares disponíveis. Mas há bons exemplos, como Cristalina (GO), cujas plantações de sorgo representam a maior área do país irrigada por pivô central. A produção de grãos pode crescer muito com a irrigação, sem que seja necessário abrir novas áreas de plantio. O feijão é um dos grãos que mais se beneficiam da água na medida certa, podendo render quase 500% mais. Arroz e milho irrigados também têm potencial de aumento de produtividade acima de 100%. Um dos intuitos do incentivo à irrigação agora, diz o secretário, é reduzir a pressão para a abertura de novas fronteiras agrícolas por meio do desmatamento. “A tecnologia é o caminho”, diz.



PROFISSIONALIZAÇÃO

A expectativa dos especialistas é que a nova política contribua para profissionalizar a irrigação, evitando amadorismos, que geram resultados aquém do que o país é capaz. Segundo Lineu Neiva Rodrigues, pesquisador da Embrapa Cerrados, a irrigação eficiente e sustentável não gera desperdício nem lixiviação, não causa erosão no solo nem perda de insumos ou energia. “A capacitação do agricultor será fundamental para a política dar certo.” De fato, a lei prevê, entre outros instrumentos, incentivos à formação de recursos humanos, à pesquisa científica e tecnológica, à assistência técnica e extensão rural, o que deve acontecer no longo prazo.

O Censo Agropecuário de 2006 mostrou que em mais de 50% das propriedades com irrigação por aspersão o sistema foi instalado sem nenhum tipo de orientação técnica. Segundo Fernando Tangerino, engenheiro agrônomo e professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Ilha Solteira, em nome da economia e devido à falta de conhecimento ainda se cometem muitos erros. Ele diz que contratar uma consultoria especializada que faça as devidas análises e planeje o projeto do começo ao fim é indispensável para não errar. Um sistema de irrigação deve ser projetado para: 1) distribuir água de maneira uniforme na área; 2) atender às demandas da planta; 3) ser feito de bons materiais; 4) ter boa montagem. Além de investir em especialistas e bons equipamentos, é preciso também buscar conhecimento, pois a irrigação correta requer cálculos e raciocínios precisos.


Irrigação de hortaliças por aspersão

Os especialistas são unânimes em dizer que não existe um sistema de irrigação que seja bom para todos: só existe um projeto perfeito para cada fazenda, pois as condições nunca são iguais. Os pivôs centrais têm sido usados em grandes propriedades para o cultivo de grãos. Para hortaliças, são usados tanto o minipivô quanto o gotejamento e os aspersores, conforme as características da lavoura. Na citricultura, há quem use gotejamento e microaspersão combinados. O gotejamento localizado costuma ser o sistema mais caro e difícil de manejar, portanto, é mais indicado para culturas de maior valor agregado.

Albano Araújo, coordenador da estratégia de água doce da organização internacional The Nature Conservancy (TNC), diz que a nova política será um grande avanço se não resultar em aumento de áreas irrigadas com sobrexplotação de recursos hídricos. “É necessário respeitar os limites ambientais para captação de água dos rios, lagos e do lençol freático”, afirma. Para isso, há programas de incentivo da Agência Nacional de Águas. Outras medidas incluem a proteção das margens de rios, nascentes e zonas de recarga de aquíferos, cujo uso deve ser limitado e disciplinado por planos de manejo adequados. “Caso contrário, poderemos ter de enfrentar impactos muito sérios sobre a disponibilidade de água para outros usos, como o abastecimento humano e o uso industrial”, diz Araújo. Na nova política, o uso múltiplo do recurso hídrico deve ser privilegiado.

O planejamento de um sistema de irrigação deve considerar ainda todos os prazos, serviços e custos envolvidos. Atualmente, a obtenção de licença ambiental leva de seis meses a cinco anos. A entrega dos equipamentos, segundo uma empresa paulista, demora de 90 a 120 dias, depois de definido qual o sistema mais adequado. O investimento inicial na compra dos equipamentos, estimado pelo governo, pode variar entre R$ 2 mil e R$ 8 mil por hectare e é preciso prever ainda despesas com manutenção, energia elétrica, auditoria para identificar falhas, equipe de manejo e troca de equipamentos depois de 25 anos aproximadamente. Em bacias hidrográficas em que há cobrança pelo uso da água, esse custo também deverá entrar na conta.

Para um melhor retorno do investimento, recomenda-se combinar o melhor aporte de água com cuidados complementares com o solo, como plantio direto, fertilização adequada e correção da acidez. “Irrigação sozinha não faz milagre”, diz Regina Célia Pires, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Como a irrigação aumenta o número de safras ao ano, é preciso considerar também a rotação de culturas. É o que fazem os produtores de grãos da Associação do Sudoeste Paulista de Irrigantes e Plantio na Palha (Aspipp), na região da Bacia do Paranapanema. Eles começaram a irrigar sem muito conhecimento 30 anos atrás, com base na experiência de vizinhos, para se precaver contra o prejuízo nas épocas de veranico, que chegam a 90 dias a cada dois ou três anos. Depois de algumas safras consecutivas de feijão irrigado, surgiram problemas, relata o agricultor Alfonso Sleutjes, posteriormente corrigidos com a rotação de culturas e o plantio sobre a palha, que preserva o solo e acumula mais carbono. Hoje, obtém uma produção de 3.300 quilos por hectare, cinco vezes mais do que se produzia ali há 30 anos – e olha que o índice de chuvas por lá alcança a média anual de 1.300 mililitros. “A irrigação tornou-se nosso seguro.”

Sem segredos

O primeiro passo para aproveitar os novos incentivos com eficiência é conversar com os vizinhos e informar-se na prefeitura sobre as demandas e planos para a região. Se houver potencial para irrigação, o produtor deve encomendar um estudo técnico de sua propriedade e das condições de cultivo que leve em conta o tamanho da área de plantio, a topografia, os índices pluviométricos, as condições de armazenamento de água, a distância até a fonte hídrica e o reservatório, os demais usos e usuários da fonte hídrica, as previsões climáticas, as obras de infraestrutura necessárias, o fornecimento de energia, o tipo e as condições do solo, o tipo de cultura, a idade e o porte das plantas, o espaçamento entre elas e a evapotranspiração. Esta última, ressalta Fernando Tangerino, da Unesp, tem de ser uma das palavras mais importantes no vocabulário do irrigante. Depende dela o cálculo correto de quanta água aplicar, quando, por quanto tempo e em qual ritmo, a fim de que o aumento na produtividade seja o melhor possível e o impacto ambiental o menor.

Futuramente, o Sistema Nacional de Informações sobre Irrigação, outro instrumento previsto na nova política, dará suporte à tomada de decisão. Enquanto isso, os interessados podem buscar dados históricos nos registros da Embrapa ou indicadores atualizados em centros de agrometeorologia, como o Ciiagro, do governo de São Paulo (http://ciiagro.sp.gov.br ).

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