domingo, 21 de outubro de 2012

A tutela jurídica do meio ambiente


Artigo
A tutela jurídica do meio ambiente
Marcelo Viana de Oliveira
Elaborado em 09/2012. Página 1 de 1 A A
http://jus.com.br/revista/texto/22811/a-tutela-juridica-do-meio-ambiente

O meio ambiente dispõe de suficiente regramento legal, tanto no que concerne a mecanismos protetivos quanto coercitivos, visando a sua devida manutenção contra degradação.

Resumo: Este artigo apresenta um esboço acerca da tutela jurídica ambiental no Brasil, através da colação de ocorrências correspondentes na Constituição Federal, bem como de uma breve apresentação da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98) e do Decreto nº 6.514/08, que regulamentou as infrações administrativas na referida lei. Com base em análise da legislação pertinente, bem como no amparo em doutrinadores diversos, são apresentados alguns apontamentos acerca da matéria em análise.

Palavras-chave: Tutela ambiental; direito ambiental; direito constitucional.

INTRODUÇÃO

Com o advento da Constituição Federal de 1988, o direito ambiental ganhou considerável proteção em diversas áreas, seja no âmbito econômico, jurídico, processual, engrossando o campo tutelar ambiental em nosso país.

Assim, através do presente artigo buscamos realizar uma apresentação desta evolução, tanto na Constituição quanto em algumas leis esparsas escolhidas.

O presente artigo encontra-se dividido em três capítulos, sendo que o primeiro aborda como o meio ambiente foi disciplinado na Constituição Federal; o segundo apresenta uma síntese sobre dano ambiental e sua reparação; o terceiro, por fim, elenca a tríplice responsabilidade ambiental do infrator.

1  O meio ambiente na Constituição da República Federativa do Brasil

A conquista de um sistema protetivo do meio ambiente representa uma conquista de toda a humanidade, visto que a manutenção da qualidade ambiental para as presentes e futuras gerações consubstancia-se em um objetivo a ser almejado por todos.

O meio ambiente conquistou considerável espaço no texto constitucional vigente, contando com capítulo próprio (Capítulo VI do Título VIII), (no qual consta o artigo 225), o qual preconiza que:


Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Além do referido capítulo, podem ser encontradas referências esparsas no texto constitucional, como a previsão de defesa pelo cidadão através de ação popular, conforme garantido no artigo 5º, LXXIII.

A proteção do meio ambiente é de competência comum dos entes da federação, tal como prescreve o art. 23 da Constituição Federal, estando inserido dentre as funções institucionais do Ministério Público.

Além disso, o meio ambiente ganhou manifesta importância na ordem econômica, tendo em vista o desenvolvimento sustentável, ou seja, a busca do desenvolvimento econômico com impacto ambiental mínimo.

Em um país de dimensões continentais como o Brasil, cujas riquezas naturais se destacam, não poderia deixar de estar insculpida na Constituição a proteção a essas riquezas, na medida em que a exploração predatória e desregrada implicaria em impactos ambientais negativos.

Encontramos ainda no texto constitucional, a proteção do meio ambiente na saúde e na comunicação social.

Para que seja efetivada a tutela ambiental, é necessário que haja a correspondente legislação protetiva. Sendo assim, na Constituição encontramos previsão legislativa nos artigos 24, VI e VIII, inserindo o meio ambiente como competência legislativa concorrente dos entes da federação, propiciando uma maior abrangência protetiva.

Nas palavras de Celso António Pacheco Fiorillo:

A Constituição Federal de 1988 consagrou de forma nova e importante a existência de um bem que não possui características de bem público e, muito menos, privado, voltado à realidade do século XXI, das sociedades de massa, caracterizada por um crescimento desordenado e brutal avanço tecnológico. Diante desse quadro, a nossa Carta Magna estruturou uma composição para a tutela dos valores ambientais, reconhecendo-lhes características próprias, desvinculadas do instituto da posse e da propriedade, consagrando uma nova concepção ligada a direito que muitas vezes transcendem a tradicional idéia dos direitos ortodoxos: os chamados direitos difusos.[1]

Ou seja, na Constituição Federal encontramos a tutela dos direitos ambientais, caracterizados como um direito difuso, pois “...apresenta-se como um direito transindividual, tendo um objeto indivisível, titularidade indeterminada e interligada por circunstâncias de fato”.[2]

Assim, os direitos concernentes ao meio ambiente, transcendem o individuo, ultrapassando o limite da esfera de direitos e obrigações de cunho individual, alcançando dimensão coletiva, apresentando-se como um direito pertencente a todos  indistintamente, como, por exemplo, o ar atmosférico.



2 O dano ambiental e as formas de reparações

A preservação do meio ambiente é de suma importância para todos, devendo o poder público tomar as medidas necessárias a essa preservação, através da elaboração de normas de proteção, bem como sanções nos casos de dano ambiental.

Por dano ambiental podemos tomar, por analogia, a definição de degradação ambiental, trazida pela Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, qual seja: “[...] a alteração adversa das características do meio ambiente”.

Seja como for, a preservação do meio ambiente é assunto que interessa a todos, dado seu inestimável valor e a crescente conscientização acerca da necessidade de tal preservação.

Neste sentido Carlos Roberto Gonçalves se pronuncia:

A ação destruidora da natureza agravou-se neste século em razão do incontido crescimento das populações e do progresso científico e tecnológico, que permitiu ao homem a completa dominação da terra, das águas e do espaço aéreo. Com suas conquistas, o homem está destruindo os bens da natureza que existem para o seu bem-estar, alegria e saúde; contaminando rios, lagos, com despejos industriais, contendo resíduos da destilação do álcool, de plástico, de arsênico, de chumbo ou de outras substâncias venenosas; devastando florestas; destruindo reservas biológicas; represando rios, usando energia atômica ou nuclear.[3]

Para minimizar a ocorrência de dano ambiental, o legislador, bem como os órgãos de proteção do meio ambiente devem lançar mão de medidas preventivas e repressivas. Sendo assim:

A reparação do dano ambiental pode consistir na indenização dos prejuízos, reais ou legalmente presumidos, ou na restauração do que foi poluído, destruído ou degradado. A responsabilidade do réu pode ser repressiva da lesão consumada ou preventiva de sua consumação iminente.

[...]

Na questão do dano ambiental é bastante possível a previsão de reparação de um dano ainda não inteiramente realizado mas que fatalmente se produzirá, em decorrência de fatos já consumados e provados, como nas hipóteses de dano decorrente de atividades nucleares, danos à saúde e aos rios decorrentes do emprego de agrotóxicos, danos aos ecossistemas de uma região em razão do vazamento de oleoduto etc.[4]

Além da Constituição, tal tutela apresenta-se espalhada em diversas normas infraconstitucionais, destacando-se a Lei nº 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, na qual em seu artigo 4º prevê a imposição ao poluidor a obrigação de reparar ou indenizar os danos causados.

A proteção do meio ambiente contra os danos a que o mesmo está sujeito merece a constante atenção dos legisladores, para combater os infindáveis atentados que vem sofrendo.

3 A responsabilidade ambiental

A reparação do dano ambiental corresponde a três tipos possíveis de responsabilidade: civil, penal e administrativa.

Nos ensinamentos de Celso Antônio Pacheco Fiorillo:

O art. 225, § 3º, da Constituição Federal previu a tríplice responsabilidade do poluidor (tanto pessoa física como jurídica) do meio ambiente: a sanção penal, por conta da chamada responsabilidade penal (ou responsabilidade criminal), a sanção administrativa, em decorrência da denominada responsabilidade administrativa, e a sanção que, didaticamente poderíamos denominar civil, em razão da responsabilidade vinculada à obrigação de reparar danos causados ao meio ambiente.[5]

Do exposto, conclui-se que a responsabilidade ambiental pode apresentar-se como civil, penal ou administrativa, de acordo com o regime jurídico aplicável. Havendo processo judicial para apuração da infração, ocorrerá a aplicação de sanção civil ou penal, a primeira com conseqüências patrimoniais e a segunda com limitação da liberdade, perda de bens, multa etc. Em caso de procedimento administrativo, penalidade administrativa.

3.1 Responsabilidade civil por dano ao meio ambiente

No que tange à responsabilidade civil por dano ao meio ambiente, destaca-se em nosso ordenamento jurídico a já citada Lei 6.938/81, que no parágrafo primeiro do seu artigo 14, destaca a aplicação das penalidades ao infrator, através de apuração de responsabilidade objetiva, ou seja, independentemente de culpa, diferente do que ocorreria se fosse atribuída responsabilidade subjetiva, na qual a culpa é imprescindível.

A aplicabilidade da responsabilidade civil objetiva é encontrada na jurisprudência, como no exemplo abaixo:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. APREENSÃO DE VEÍCULO POR SUSPEITA DE ADULTERAÇÃO DE COMBUSTÍVEL. AUSÊNCIA DE ATO ARBITRÁRIO DOS AGENTES POLICIAIS. FATO NOTICIADO PELA IMPRENSA. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE.

1. A responsabilidade objetiva baseia-se na teoria do risco administrativo, dentro da qual basta a prova da ação, do dano e de um nexo de causa e efeito entre ambos, sendo, porém, possível excluir a responsabilidade em caso de culpa exclusiva da vítima, de terceiro ou ainda em caso fortuito e força maior.[6]

Conforme se extrai da ementa acima, a responsabilidade civil é formada por três elementos, quais sejam: a conduta humana, a qual pode ser comissiva ou omissiva; os danos causados, consistentes no prejuízo patrimonial ou moral; e o nexo de causalidade entre eles, interligando o ato danoso ao agente.

A reparação civil dos danos ambientais pode consistir em indenização dos danos causados, reais ou presumidos, ou na restauração do que foi poluído, destruído ou degradado, caso seja possível. Sendo a responsabilidade preventiva ou repressiva.

Ocorrendo lesão ao meio ambiente, surge para o causador o dever de indenizar o dano material, concernente aos prejuízos patrimoniais e o dano moral, concernente aos prejuízos à personalidade.

3.2 Responsabilidade penal ambiental

O crime constitui um fato típico, ou seja, consubstanciado em uma circunstância descrita na lei, antijurídico, posto que contrário ao ordenamento jurídico, e culpável, pois para que se possa imputar algum ilícito a alguém, é necessário que o mesmo tenha atuado, no mínimo, com culpa.

Tais elementos, fato típico, antijurídico e culpável, constituem os chamados conceito analíticos de crime, sendo aplicável ao Direito Ambiental, quando da ocorrência do dano (infração ambiental).

Entretanto, diferente da responsabilidade civil objetiva, aplicada na seara ambiental, marcada pela desnecessidade de comprovação de culpa, a responsabilidade penal ambiental é subjetiva, carecendo de tal comprovação para a sua caracterização, dada a maior gravidade da penalização.

Quanto à distinção entre as modalidades de responsabilidade ambiental, esclarece Fiorillo:

A distinção fundamental, trazida pelos doutrinadores, está baseada numa sopesagem de valores, estabelecida pelo legislador, ao determinar que certo fato fosse contemplado com uma sanção penal, enquanto outro com uma sanção civil ou administrativa. Determinadas condutas, levando-se em conta a sua repercussão social e a necessidade de uma intervenção mais severa do Estado, foram erigidas à categoria de tipos penais, sancionando o agente com multas, restrições de direito ou privação de liberdade. A penalidade da pessoa jurídica foi um dos avanços trazidos pela Constituição Federal de 1988.[7]

A responsabilidade penal ambiental foi trazida a lume pela Constituição Federal de 1988, a qual em seu artigo 255, § 3º, prescreve a tríplice responsabilização do infrator: civil, penal e administrativa, seja pessoa física ou jurídica, o que foi reafirmado na Lei nº 9.605/98, que dispõe acerca dos crimes ambientais.

A penalização da pessoa jurídica é tema recorrente na jurisprudência, como por exemplo:

APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME AMBIENTAL - APELAÇÃO DA DEFESA - INÉPCIA DA DENÚNCIA - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA - APELAÇÃO MINISTERIAL - CONDENAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA. RECURSO DA DEFESA NÃO PROVIDO E RECURSO MINISTERIAL PROVIDO. - Por apresentar todas as formalidades legais e possibilitar a defesa eficaz dos réus, não há que se falar em inépcia da denúncia. - Estando cabalmente demonstradas a autoria e a materialidade pelo conjunto probatório, inclusive com a confissão do réu, não há como absolver os acusados. - O art. 225, § 3º, da CF, acompanhado do art. 3º da Lei 9.605/98, encerra a discussão sobre a legalidade e legitimidade das pessoas jurídicas na esfera criminal. - Recurso da defesa não provido e recurso ministerial provido.[8]

Apesar de polêmica doutrinária, a jurisprudência, embasada na Constituição Federal e na lei de crimes ambientais, mantém postura pela criminalização das pessoas jurídicas, quando o bem jurídico prejudicado for o meio ambiente.

3.3 Responsabilidade administrativa ambiental e o exercício do poder de polícia: A PNMA e os órgãos do SISNAMA

Um dos integrantes da tríplice responsabilização no campo do Direito Ambiental, a responsabilidade administrativa, concretizada pela aplicação de penalidades pela Poder Público, no exercício de seu poder de polícia, também encontra previsão constitucional no referido artigo 225.

As sanções administrativas encontram-se disciplinadas na Lei nº 9.605/98, especialmente em seus artigos 70 a 76, sendo que naquele encontramos a definição de infração administrativa ambiental, como sendo “toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente”.

A referida Lei encontra-se atualmente regulamentada pelo Decreto nº 6.514/08, o qual pormenoriza as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, além de estabelecer o processo administrativo federal para apuração destas infrações.

Para dar cumprimento à legislação ambiental, temos o SISNAMA – Sistema Nacional de Meio Ambiente, criado pela Lei nº 6.938/81, composto por integrantes de todos os entes da federação.

Além de criar o SISNAMA, a Lei 6.938/81 definiu a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA), a qual visa “a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental...”, para tanto definindo padrões de qualidade ambiental, desenvolvimento de pesquisas de uso racional dos recursos naturais, dentre outras medidas, a serem executadas pelos órgãos referido Sistema.



CONCLUSÃO

Por todo o exposto, concluímos que o meio ambiente dispõe de considerável carga legal, tanto no que concerne a mecanismos protetivos quanto no que concerne a mecanismos coercitivos, visando a sua devida manutenção contra degradação.

Tais mecanismos podem ser facilmente encontrados na Constituição Federal, a qual, além de manter capítulo próprio acerca do tema, mantém disposições esparsas com vistas à fiel proteção ambiental.

Encontramos, ainda, tutela ambiental nas diversas leis especiais atinentes à matéria, destacando-se a lei de crimes e infrações administrativas ambientais, corroborada pelo decreto correspondente, bem como os demais diplomas legais.

Assim, não é por carência normativa que o meio ambiente vai continuar sofrendo exploração predatória e degradativa, mas sim pela incessante ganância dos seres humanos, e sua irresponsabilidade na manutenção de bem natural tão precioso e finito.

REFERÊNCIAS

[1] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 62.

[2] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 56.

[3] DINIZ, Maria Helena apud GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 116.

[4] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 125.

[5] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 129.

[6] TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO. AC 2000.36.00.010623-5/MT, Rel. Desembargador Federal FAGUNDES DE DEUS. Publicado em 22 de setembro de 2009. Acesso em 27 de outubro de 2011.

[7] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 144.

[8] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. 0829633-23.2006.8.13.0342 Rel. Desembargador FLÁVIO LEITE. Publicado em 01 de abril de 2011. Acesso em 30 de outubro de 2011.



Leia mais: http://jus.com.br/revista/texto/22811/a-tutela-juridica-do-meio-ambiente#ixzz29y8ikxIC

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